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Blocos afro e afoxés celebram décadas de resistência em 2024

Matheus Calmon • 24/01/2024 - 14:57
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		Blocos afro e afoxés celebram décadas de resistência em 2024
Imagem: Láis Rocha

Os blocos afro, manifestações culturais que têm raízes profundas na história afro-brasileira, vivem, em 2024, um ano de muita festa. Extensa, a lista de aniversários emblemáticos inclui os 75 anos do Afoxé Filhos de Gandhy, os 50 anos do Ilê Aiyê, os 45 anos do Olodum, os 45 anos do Malê Debalê, os 30 anos da Banda Didá e os 25 anos do Cortejo Afro.

PUBLICIDADEImpulsionado pelos 50 anos do Ilê Aiyê, primeiro bloco afro do Brasil – quiçá do mundo –, o Carnaval de Salvador em 2024, vai homenagear as agremiações afro através do tema “50 Anos de Blocos Afro. Nossa Energia é Ancestral”.

Estas décadas de resistência e expressão artística são tema de um documentário especial produzido pelo Grupo A TARDE, que conversou com representantes destas entidades e ouviu suas histórias, anseios e expectativas para o futuro. O projeto, batizado de "Sons do Terreiro Mundo", explora também como o chão dos terreiros de candomblé foram cruciais para o desenvolvimento da musicalidade, e vai estrear em breve no canal do YouTube A TARDE Play.

Presidente do Ilê Aiyê, Antônio Vovô ressalta que o bloco tem muito a agradecer ao Terreiro Ilê Axé Jitolú e à matriarca do bloco, Hilda Jitolú. Criado nos anos 70, em plena ditadura, o “Mais Belo dos Belos” surgiu numa época em que o acesso de pessoas negras ao carnaval se dava apenas tocando instrumentos ou carregando alegorias.

"O Ilê tem que dizer: 'ah, se não fosse o Jitolú'. Quanto tivemos a ideia de fundar o bloco, desci todo empolgado, conversei com mãe [Hilda], ela achou a ideia bacana. A preocupação dela é que a gente fosse preso. Eu tinha 21 anos e não estava nem preocupado com ditadura. Antes do Ilê ela sempre acolhia minha turma. Se não tivesse esse acolhimento, seria muito complicado. Tudo era realizado aqui no terreiro".

No Afoxé Filhos de Gandhy, Mestre Reginaldo conta que o coração ainda bate forte quando o carnaval chega, mesmo após várias décadas curtindo o bloco.

"E como bate. Embora saia com mais duas agremiações. Eu acho que se deixar de sair algum dia vou ter problema. Também não posso deixar de fumar, também vou ter problemas. Meus filhos vinham comigo para o ensaio", conta ele, que é corroborado pela filha, Itaguaracema Bispo.

"É muito gratificante. Fui criada dentro dos Filhos de Gandhy, hoje faço parte das Filhas. É uma emoção muito grande. Estar aqui com meu pai é mais emocionante ainda. Eu acho que o melhor símbolo é o turbante, é um símbolo muito forte".

Já Cláudio Araújo, presidente do Malê Debalê, conta que a história do bloco se confunde com sua própria história.

"Eu vivi aqui, nasci aqui, almoço aqui...Estar à beira dos 45 anos nada mais é que confundir com minha própria idade. Nasci nesta entidade. O bloco foi fundado na sala de minha avó. Que esses 45 anos nada mais é do que coroar. Precisamos colocar na cabeça dos gestores que a Revolta dos Malês é tão importante quanto a guerra dos Alfaiates, revolta de Tiradentes, eventos tão importantes para o nosso povo negro".

Filhos de Gandhy reúnem apaixonados pelo afoxé em tapete branco da paz| Foto: Lais Rocha | Ag. A TARDE

Marcas ancestrais

E se não há como falar de carnaval sem bloco afro, é porque há discursos sociais e culturais já imortalizados. Presidente do Olodum, Marcelo Gentil frisa que a paz sempre foi um discurso defendido pela agremiação. Ele conta ainda que a marca do bloco é o símbolo brasileiro mais reconhecido no mundo.

"A paz sempre foi um discurso divulgado pelo Olodum, faz parte do nosso dia a dia, faz parte das nossas ações e da nossa razão de viver. O publicitário João Silva pegou essa marca e colocou as cores do pan-africanismo: o vermelho, amarelo, verde e preto, e transformou a marca do Olodum em uma das mais reconhecidas do mundo. Para lembrar de outra, tem que puxar muito da memória".

Em 2024, a Banda Didá homenageia Neguinho do Samba, criador do bloco. A diretora de projetos do coco, Adriana Portela, frisa que o grupo, primeira banda exclusivamente formada por mulheres de samba reggae do mundo, é sinônimo de representatividade feminina.

"Através da Didá vimos que outras mulheres se perceberam capazes e elas tiveram uma referência, porque, até então, as mulheres não tinham essa referência da mulher tocando tambor e se era possível isso. A importância é esse recorte social. A Didá quebrou esse paradigma e mostrou que a mulher também poderia tocar e colocar esse tambor que diziam ser gigante na cintura. A mulher dá a vida, acho que esse é um acontecimento de rebento tão importante no mundo, então a mulher pare o tambor também".

Cantor do Bloco Cortejo Afro há 25 anos, Aloísio Menezes lembra a história do bloco e critica a ausência de agremiações na eleição para a música do carnaval, mesmo muitas vezes outros artistas alçando sucesso com trabalhos dos grupos.

"Alberto Pita, quando me convidou para o Cortejo, eu perguntei: 'qual a proposta do Cortejo Afro?'. Ele disse: 'É resgatar as cores perdidas do Carnaval'. São as escolas de samba, os afoxés, os blocos de índio. Todas as roupas do cortejo você vê sempre essa composição, esse elemento. Há quantos anos a gente faz as músicas, o povo regrava, faz sucesso...É uma forma nobre de perguntar pela galera preta que fez a música da Bahia a vida inteira. Todo ano quando escolhe a música do Carnaval só escolhe da galera que só faz pegar nossa arte, nosso suor. Não vejo respeito pelo compositor, pelo percussionista, pelo batuqueiro. Está na hora de mudar isso".

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